terça-feira, 17 de maio de 2011

MAB se preocupa com posturas conservadoras do governo na regulamentação do decreto presidencial

MAB se preocupa com posturas conservadoras do governo na regulamentação do decreto presidencial

Publicado em ter, 19/04/2011 - 13:48

     Assinado em outubro de 2010 pelo então presidente Lula, o decreto que institui o cadastro socioeconômico dos atingidos por barragens está agora na fase de regulamentação
     No último dia 14 de abril, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) participou de uma reunião com o “Comitê Provisório” responsável por regulamentar o Decreto Presidencial 7.342/2010, que estabelece o cadastramento dos atingidos por barragens.
     Esta agenda de reuniões foi pleiteada pelo MAB, com o objetivo de avançar em propostas para superar os atuais erros cometidos na construção de barragens no país. Para o MAB, se o Governo brasileiro não assumir sua responsabilidade e avançar no tratamento das questões sociais, ambientais e trabalhistas, os conflitos e a situação de tensão persistirão em todas as obras do PAC.
     Fazem parte do “Comitê Provisório” representantes dos Ministérios da Agricultura, Meio Ambiente, Aquicultura e Pesca, Minas e Energia e do Incra. A coordenação do Comitê é de responsabilidade do MME.
     Para as lideranças do MAB, é de fundamental importância que a regulamentação do decreto venha fortalecer seu âmbito democrático, com a participação popular ao longo de todo processo, inclusive nesta fase de regulamentação, já que trata do cadastro das populações atingidas e são estas as principais vitimas do atual modelo energético.
     No entanto, o Movimento manifesta sua apreensão com relação a algumas posturas conservadoras no âmbito do Comitê, e em especial com o Ministério de Minas e Energia. O decreto diz que o “cadastro sócio-econômico é um registro público para identificação, qualificação e quantificação da população atingida”, portanto é de utilidade e caráter público, e por isso deve ser de responsabilidade e realizado por órgão público.
     Atualmente o cadastro nem sequer é feito antes das obras, e quem faz são as empresas privadas, causando toda espécie de violação dos direitos dos atingidos. Em Jirau e Santo Antonio, palco de violentos protestos no último período, as obras estão praticamente prontas e o cadastro dos atingidos ainda não é público, o que, segundo as lideranças do MAB, é uma falta de respeito e seriedade para com a sociedade e, em especial, para com os afetados.
     “O cadastro sócio-econômico é sobre os atingidos. Logo não interessa a delimitação de polígonos, tal como sugere o Ministério de Minas e Energia na regulamentação, porque a introdução deste conceito é retroceder nos avanços já tidos quanto ao que significa a amplitude do conceito de atingido. Adotar o conceito de polígono não ajuda no reconhecimento das populações atingidas. Este conceito estreito e patrimonialista é da época da ditadura militar, portanto um conceito ultrapassado nacional e internacionalmente, superado inclusive em muitos acordos sociais que foram reconhecidos por estatais do setor elétrico”, diz Joceli Andrioli, da coordenação Nacional do MAB.
     O MAB teme que o reconhecimento do ex-presidente Lula sobre a dívida histórica do Estado brasileiro para com os atingidos por barragens e o avanço que poderia ser dado com o decreto sejam jogados por terra, dado os interesses dos que mandam no setor elétrico brasileiro.
     “Acreditamos viver um período possível para que o Estado brasileiro avance no reconhecimento dos direitos daqueles que são expulsos de suas terras para dar lugar a construção das grandes barragens no país, e finalmente atender os que sempre tiverem seus direitos humanos violados. Por isso, para nós o momento é de avanços e não de retrocessos” conclui Andrioli.



Decreto Cadastro Socioeconomico para atingidos por barragens.


DECRETO Nº 7.342, DE 26 DE OUTUBRO DE 2010.

Institui o cadastro socioeconômico para identificação, qualificação e registro público da população atingida por empreendimentos de geração de energia hidrelétrica, cria o Comitê Interministerial de Cadastramento Socioeconômico, no âmbito do Ministério de Minas e Energia, e dá outras providências.


O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, incisos IV e VI, alínea “a”, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 3o-A da Lei no 9.427, de 26 de dezembro de 1996,



DECRETO:
Art. 1o Fica instituído o cadastro socioeconômico, como instrumento de identificação, qualificação e registro público da população atingida por empreendimentos de geração de energia hidrelétrica.
Parágrafo único. Deverá ser assegurada ampla publicidade ao cadastro de que trata este Decreto.

Art. 2o O cadastro socioeconômico previsto no art. 1o deverá contemplar os integrantes de populações sujeitos aos seguintes impactos:
I - perda de propriedade ou da posse de imóvel localizado no polígono do empreendimento;
II - perda da capacidade produtiva das terras de parcela remanescente de imóvel que faça limite com o polígono do empreendimento e por ele tenha sido parcialmente atingido;
III - perda de áreas de exercício da atividade pesqueira e dos recursos pesqueiros, inviabilizando a atividade extrativa ou produtiva;
IV - perda de fontes de renda e trabalho das quais os atingidos dependam economicamente, em virtude da ruptura de vínculo com áreas do polígono do empreendimento;
V - prejuízos comprovados às atividades produtivas locais, com inviabilização de estabelecimento;
VI - inviabilização do acesso ou de atividade de manejo dos recursos naturais e pesqueiros localizados nas áreas do polígono do empreendimento, incluindo as terras de domínio público e uso coletivo, afetando a renda, a subsistência e o modo de vida de populações; e
VII - prejuízos comprovados às atividades produtivas locais a jusante e a montante do reservatório, afetando a renda, a subsistência e o modo de vida de populações.
Parágrafo único. Para os efeitos do disposto neste Decreto, o polígono do empreendimento abrange áreas sujeitas à desapropriação ou negociação direta entre proprietário ou possuidor e empreendedor, incluindo as áreas reservadas ao canteiro de obras, ao enchimento do reservatório e à respectiva área de preservação permanente, às vias de acesso e às demais obras acessórias do empreendimento.

Art. 3o Fica instituído o Comitê Interministerial do Cadastro Socioeconômico, no âmbito do Ministério de Minas e Energia, com as seguintes funções:
I - apresentar, no âmbito do processo de licenciamento ambiental, os requisitos para que o responsável pelo empreendimento elabore o cadastro socioeconômico da população atingida por empreendimentos de geração de energia hidrelétrica; e
II - acompanhar a elaboração do cadastro socioeconômico, a ser realizada pelo responsável pelo empreendimento, e manifestar-se sobre sua adequação.
§ 1o O Comitê será composto por representantes dos Ministérios de Minas e Energia, do Meio Ambiente, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, do Desenvolvimento Agrário, da Pesca e Aquicultura e da Secretaria-Geral da Presidência da República, cabendo ao Ministério de Minas e Energia a sua coordenação.
§ 2o O Comitê será integrado, ainda, por representantes dos órgãos e entidades federais com atribuições relativas à população atingida pelo empreendimento analisado, quanto aos impactos referidos no art. 2o.

Art. 4o O cadastro socioeconômico e o funcionamento do Comitê serão disciplinados em ato conjunto dos Ministérios de Minas e Energia, do Meio Ambiente, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, do Desenvolvimento Agrário e da Pesca e Aquicultura.

Art. 5o A Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL incluirá, nos contratos de concessão de uso do bem público e nos editais de leilão, cláusula específica sobre responsabilidades do concessionário, frente ao cadastro socioeconômico da população atingida por empreendimentos de geração de energia hidrelétrica.

Art. 6o Este Decreto se aplica aos empreendimentos a serem licenciados a partir de janeiro de 2011.

Art. 7o Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 26 de outubro de 2010; 189o da Independência e 122o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Wagner Gonçalves Rossi
Marcio Pereira Zimmermann
José Machado
Guilherme Cassel
Cleberson Carneiro Zavaski
Luiz Soares Dulci

Este texto não substitui o publicado no DOU de 27.10.2010