quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Inaugurar um novo período

1. O momento é de debate, (re)definição e (re)orientação. Hora de repensar rotinas políticas e ousar. Um novo impulso se impõe, um esforço coletivo para revigorar a capacidade de formulação programática e a incidência concreta do PT na esquerda e na sociedade, do seu diálogo e relacionamento com os movimentos sociais e com a luta socialista.

2. Fazemos um chamado a todas mulheres e homens que se reivindicam petistas e socialistas. Nosso debate precisa ser movido pelo sentido de contribuir no processo de reflexão estratégica do PT.

3. Somos construtoras e construtores do PT, atentos às transformações em curso e comprometidos com a continuidade das alterações substanciais da sociedade brasileira. Atuamos em diferentes frentes e espaços políticos. Somos militantes, dirigentes partidários e do movimento social, estudantes, acadêmicos, parlamentares, gestores, enfim mulheres e homens – gays e lésbicas, jovens e adultos, trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, negros e brancos, internacionalistas, radicais, socialistas – convictos da necessidade de valorizar nossas múltiplas identidades e trajetórias e de reafirmar nossa matriz ideológica.

4. Desejamos construir uma síntese política e organizativa – socialista e petista, na qual o protagonismo dos setores historicamente excluídos seja um pressuposto – e não uma mera concessão. Nesse momento nos desafiamos e ousamos proclamar a necessidade de aprofundar nossa narrativa.

5. Queremos propor uma nova orientação política que tenha vocação de incorporar novos (e velhos) personagens, que seja capaz de lutar pela instauração de direitos. Queremos propor um momento, um novo ciclo, nos desafiando a apresentar uma formulação no campo da estratégia e da tática, que responda aos desafios atuais e futuros.

6. O que nos une é a possibilidade da construção de um programa no qual todos sejam protagonistas. Uma elaboração que parta dos princípios do marxismo, mas que não o transforme em bíblia, engessada, que comprometa os fundamentos básicos da dialética marxista. Propomos uma construção dialógica, em que se propõe novo programa e disposição política para absorver as críticas e observações existentes, venham de onde vier, um programa construído a muitas mãos.

7. Não queremos nos limitar a pensar dentro dos mesmos esquemas e roteiros habituais, restringindo as discussões a aspectos regionais, táticos, pontuais, setoriais, apenas repetindo estéreis disputas intestinais, com resultados mais ou menos já conhecidos.

8. Almejamos construir uma intervenção política e social num partido de massas, novo em sua história, mas não tão novo em seus métodos e atuação. Queremos reivindicar, de fato, o protagonismo das mulheres, dos jovens, dos negros, dos camponeses, dos homossexuais, dos trabalhadores e trabalhadoras – apontando para a superação do hegemonismo exclusivo de uma geração donde estas questões foram tratadas como “desvio pequeno burguês” ou como fracionismo da classe trabalhadora.

9. Defendemos um programa que incorpore – como seus elementos constitutivos - o combate as opressões de classe, de gênero e de raça. E absorva o compromisso inegociável com a superação de toda forma de opressão e discriminação. Propomos um esforço programático que busque dar relevo às questões que, quando esquecidas e não incorporadas, jogam a favor da manutenção dos valores dominantes, inclusive na esquerda que se proclama revolucionária.

10. Um programa capaz de dialogar com os desafios antigos e contemporâneos, incorporando às lutas de classes novas contradições e novos sujeitos coletivos. A formação do PT apontou para este caminho ao dar voz aos que lutavam contra a ditadura e também de todos aqueles e aquelas que ousaram parar as máquinas e ganhar as ruas para gritar por liberdade.

11. A extraordinária constituição desta ferramenta que é o PT trouxe para o mesmo espaço uma imensa diversidade de sujeitos, milhares de estudantes, mulheres, sindicalistas, intelectuais, socialistas de todas as matrizes ideológicas refletidas naquela conjuntura. O PT abrigou lutadores que desvelaram o “homem cordial brasileiro” ao afirmar o racismo e o machismo como práticas institucionais seculares e elementares da constituição da classe trabalhadora brasileira que a pobreza tem gênero e raça: é feminina e negra.

12. Acreditamos que o desenvolvimento de um programa e de um plano de ação para uma tendência socialista deve e pode responder a esses desafios e aos dilemas de um mundo cada vez mais globalizado, onde crescem as desigualdades e discriminações. Todos nós que reivindicamos a(s) tradição(ões) marxista(s) estamos chamados a entender o cenário atual e enfrentar, na teoria e na prática, os desafios que se colocam hoje para a construção de um mundo novo.

13. É necessário reconhecer que há a ausência de uma forte corrente política de esquerda e socialista no PT, onde se faz sentir em termos de elaboração e de ação concreta. Faz-se sentir na disputa de rumos do governo Dilma, na relação orgânica com as lutas sociais, na elaboração programática, na formação política e debate ideológico.

14. Desde a vitória de Lula em 2002 que nós, do PT, somos responsáveis pela condução do governo central do Brasil. Inegavelmente, a nossa presença no governo é técnica e politicamente superior a todas as gestões anteriores. Conduzimos o Brasil à uma série de feitos inimagináveis, resgatando a auto-estima e a confiança do povo brasileiro em um futuro cada vez melhor para as atuais e próximas gerações.

15. Interrompemos o processo de privatização do no núcleo estrutural da economia, elevamos a renda dos trabalhadores(as), aumentamos a massa salarial, fortalecemos o mercado interno, aumentamos o crescimento do PIB, rompemos com a dependência do FMI, aceleramos o processo de integração regional de forma solidária, acabamos com a ALCA, contribuímos para o fortalecimento da democracia no continente, retiramos milhões de pessoas da pobreza, diminuímos as desigualdades sociais, melhoramos a educação e a saúde, por fim, reelegemos o projeto pela terceira vez com e eleição da Presidenta Dilma.

16. Ainda poderíamos elencar uma série de grandes feitos das nossas gestões que são qualificados como fatos incríveis ou inesperados, justamente por nunca antes terem acontecido. O ineditismo impactante destas ações é uma característica marcante deste novo ciclo de desenvolvimento pós-neoliberal do capitalismo no Brasil. O fato deste processo ser conduzido por um partido de trabalhadores(as) também é uma surpresa histórica. Foi necessário que o PT, nascido das lutas de enfrentamento aos patrões, chegasse ao governo para estabilizar um processo de desenvolvimento com inclusão social em um regime democrático burguês.

17. Estamos cumprindo uma série de tarefas de organização do estado, típicas das revoluções burguesas clássicas na Europa e na América do Norte. Para isso, optamos por construir um governo de colaboração de classes, onde o trabalho e o capital alcançam ganhos constantes, tais como: aumento do lucro, da massa salarial, do valor real dos salários e do nível de emprego.

18. Essa aparente sensação, de que todos ganham, só é possível porque a nossa presença no governo, combinado com o atraso secular do estado brasileiro possibilitou verdadeiros avanços comparativos para o conjunto da nossa sociedade. Está sendo possível melhorar significativamente as condições em que a classe trabalhadora reproduz a sua força de trabalho, sem destruir o núcleo estrutural da sociedade capitalista.

19. Os interesses entre burgueses e proletários são de natureza contraditória e conflituosa, sabemos que a atual conjuntura nos permite navegar pela trilha da chamada concertação¹, mas não é possível continuar conciliando indefinidamente os interesses antagônicos das classes sociais. A burguesia brasileira tem como estratégia para o desenvolvimento do capitalismo a inserção subordinada na sociedade global. Para este setor, muitas das tarefas democráticas ou reformas burguesas, simplesmente não cabem no Brasil, pois comprometeriam o pacto das elites de dominação de classe.

20. As mudanças que estão acontecendo em nossa sociedade possibilitaram ao PT e ao conjunto da esquerda, vitorias eleitorais traduzidas em um acúmulo também inédito de força institucional que paulatinamente tem desmontado a direita partidária que procura a sobrevivência através da transfiguração ideológica ou da adesão pura e simples aos nossos governos. Este adesismo reforça a opção estratégica da maioria do PT, de constituir uma frente ampla de sustentação ao programa da "revolução democrática", envolvendo inclusive partido e setores econômicos da burguesia brasileira.

21. O estado brasileiro não tem capacidade infinita de financiamento dos programas sociais. Para libertar o país da servidão econômica será necessário subverter a estrutura perversa de concentração de renda, lucros e terras, além de combater a hegemonia ideológica burguesa. Neste ponto residem os limites da atual aliança de classes, com característica de frente ampla que sustentam os nossos governos.

22. Por esse motivo, a maioria das tentativas de avanço institucional que incidam sobre a democratização da propriedade, dos lucros, da quebra dos monopólios privados, o combate as opressões especificas, tais como: racismo, machismo, sexismo, lesbofobia e homofobia, além da preservação do meio ambiente, do aumento real de salário são sistematicamente derrotadas ou boicotadas, inclusive por setores e partidos que participam da base aliada do nosso governo.

23. Estes mesmos setores se beneficiam politicamente, da utilização, de parte do nosso programa e de nossos símbolos, para confundir o eleitorado e surfar na onda de melhorias, se adaptam para manter a sua força eleitoral ao mesmo tempo em que dificultam o avanço do nosso projeto.

24. A derrota na votação do código florestal, as reações ao kit anti-homofobia, e ao PLC 122, os assassinatos de ambientalistas e de agricultores familiares, a repressão a movimentos sociais e a incapacidade de avançar na pauta das reformas estruturais são sintomas de que os limites do nosso governo já se tornaram amplos demais para os nossos “neo-aliados”, que com estas e outras demonstrações procuram encerrar, nos marcos da aceitabilidade, os avanços dos últimos anos.

25. Precisamos olhar para a história e aprender com outras experiências, particularmente na esquerda europeia, em que partidos de trabalhadores(as) que chegaram ao poder pela via eleitoral, aplicaram programas de melhorias sociais, baseados em uma política de coalizão, transformaram-se em gerentes das crises cíclicas do sistema e fizeram de sua passagem pelo poder um espaço de recuperação política da direita.

26. É importante observar, atentamente, os acontecimentos em Portugal e Espanha, países de rica tradição de luta socialista em que a contestação da crise econômica feita pelo povo nas ruas, não se traduziu em aumento da força eleitoral da esquerda, mas sim, em desencanto com os métodos e práticas de governo que confundiram a sociedade e desmobilizaram eleitoralmente a base social da esquerda nessas localidades.

27. O Programa de aceleração do crescimento, o Plano nacional de expansão da banda larga, o Programa Brasil sem miséria, as medidas complementares de controle inflacionário apontam para uma opção de continuar avançando. Mas, ainda existe muito há ser feito para melhorar a vida do povo, mesmo nos marcos do capitalismo. Quanto mais nos propusermos a avançar mais encontraremos dificuldades e, inevitavelmente, nos confrontaremos com um conjunto de interesses cristalizados, evidenciando diferenças e tensões inclusive entre e com os nossos neo-aliados.

28. Mesmo com força institucional que o governo central nos confere, não podemos esquecer que a burguesia, representada organicamente pela direita e centro-direita continua sendo maioria no congresso nacional, nas assembleias legislativas, nas câmaras de vereadores, entre os prefeitos e governadores, disputam os nossos governos, dirigem o poder judiciário, a mídia, conservam intacto o seu poderio econômico e representam a ideologia dominante na nossa sociedade. Temos o governo, mas este, por si só, não nos garante instrumentos de poder suficiente para aprofundar as mudanças em curso.

29. O grande desafio posto para os socialistas hoje está em construir os caminhos para avançar na luta socialista, no Brasil e na América Latina, quando estamos no terceiro mandato presidencial encabeçado pelo PT, em um mundo que se transforma na velocidade da internet, mas onde segue predominando a hegemonia de um capitalismo imperialista, belicista, neoliberal – e em crise constante.

30. O contraponto ao pensamento e ao discurso neoliberal-conservador e mesmo à pasteurização do PT passa pela afirmação da identidade de uma política de esquerda e socialista, não dogmática nem sectária, fundada na batalha pelo fim das discriminações, de todo tipo, que faça frente à ofensiva dos fundamentalistas – sejam religiosos ou mercantilistas.

31. Uma esquerda que entenda o profundo impacto no imaginário da classe trabalhadora, à qual se pretende representar e/ou dirigir, depois de dois mandatos Lula e no curso do mandato Dilma – período em que houve melhorias na condição de vida das classes trabalhadoras e crescimento econômico. Com milhões de Brasileiros incluídos na sociedade. Mas, onde não foram realizadas as reformas estruturais, pilares de uma sociedade inclusiva, evoluída e que possa contribuir para alterações tão profundas que independente de governos possa libertar o povo como a reforma agrária.

32. Por isso, é preciso uma esquerda petista que, entendendo o atual momento político, incorpore novos elementos, faça novos aliados internamente, agregue apoios e organize um contraponto ao processo em curso que deve ter duas características básicas: densidade programática e potência política para o enfrentamento.

33. Atualmente, existe uma intensa agitação de importantes setores da classe trabalhadora que já sentem de forma mais intensa os limites da coalizão e se apresentam para a luta. Servidores Federais, Estaduais, estudantes, trabalhadores da iniciativa privada, anti-proibicionistas, feministas, Gays e Lésbicas e outros setores, começam a demonstrar em greves e mobilizações massivas a compreensão de que não podemos depositar unicamente na institucionalidade a responsabilidade por garantir os avanços sociais.

34. Os socialistas devem se submeter a um constante preparo para serem capazes de colaborar com a classe trabalhadora no seu processo de reencontro com as mobilizações sociais. São tarefas deste preparo: exercitar constantemente disputa política e ideológica, colocar na ordem do dia o programa democrático popular, estimular as lutas sociais de massa, disputar o PT e fortalecer as organizações da esquerda socialista.

35. Uma esquerda forte e pulsante, com visibilidade pública, e que, programaticamente, incorpore atores políticos diversos, dentro do PT e faça disputa de projetos em todos os campos e em todas as esferas sempre com o mesmo vigor e coerência.

36. A experiência de ser governo, em vários níveis, principalmente após dois governos federais, impactaram fortemente a cultura da base militante e social do PT. Esse fato, acompanhado da crescente degeneração política, influenciou sobremaneira as próprias práticas e procedimentos internos do partido. Muitas relações políticas, algumas constituídas há décadas, que preexistiam antes dos governos federais petistas, esgarçaram-se. Outras mudaram e outras impensáveis nos períodos anteriores se constituíram.

37. Novos espaços de articulação política e relacionamento sobre a “direção” do Partido mudaram de patamar, radicalmente. Nós que queremos fazer a disputa, de fato, do PT, temos que entender profundamente essas e movimentar-nos, a partir destes novos cenários. Com ousadia e sem dogmatismo.

38. O esquema tradicional de disputa por meio de tendências fechadas, parlamentares, ou personalidades, é absolutamente insuficiente para visualizar as disputas políticas imensas que precisam ser travadas hoje. Influenciar o PT, inclusive, para interferir na condução do governo federal é algo muito mais complexo e difícil hoje, do que o era, no agora distante janeiro de 2003. Se quisermos ter alguma influência significativa é preciso mudar nossa orientação política e ação concreta, a nossa forma de se relacionar com outros atores nesse processo e a maneira como entendemos – e agimos - nos espaços institucionais.

39. Precisamos consolidar como política de estado, uma série de conquistas alcançadas durante os nossos governos e impulsionar uma nova etapa de vitórias. Não existem mudanças sem lutas! Seremos nós, nas ruas e avenidas, praças e ocupações que daremos sustentação as conquistas existentes e avançaremos para aprofundar as mudanças através de um programa de reformas democráticas e populares. Programa este, que incida diretamente no núcleo estrutural da economia capitalista e acumule para o socialismo.

40. Fazemos esse chamamento sem desejar estigmatizar posições, sem desqualificar interlocutores, mas conscientes de que precisamos mudar: mudar muito e mudar rápido, antes que seja tarde.

41. O nosso movimento busca incorporar todos aqueles que, enxergando as limitações e as oportunidades do momento atual, se disponham a vir construir um novo caminho, para avançarmos e crescermos. Aqui não há soluções prontas, nem fórmulas, nem receitas, nem verticalismos. Todas as pessoas estão convocadas a serem protagonistas nessa construção.

42. Acreditamos que um salto qualitativo em nossa elaboração, em nosso programa, em nossos métodos em nossa orientação política pode contribuir para abrir um processo onde o conjunto do PT se repense , se reposicione.

43. Com isto, espera-se construir um campo petista, de esquerda que nos uma à aquelas e aqueles que compreendem e reafirmam a disputa do PT como uma questão estratégica. Um movimento que possibilite a criação de espaços para debates de fundo, até então subestimados. Não somos, como afirmam alguns, uma “esquerda comportamental”, menor ou ingênua, que ignora a base estrutural dos fenômenos sociais.

44. É por isso que, entendendo as contradições e limites, defendemos relações mais orgânicas – sem pretensão de tutela – com todos os movimentos sociais: feminista e de mulheres, das negras e negras, da juventude, da cidadania LGBT, dos trabalhadores e trabalhadoras urbanas e rurais, das populações do campo e da floresta, dos direitos humanos, pela democratização da cultura e comunicação. Em especial acreditamos que é necessária a reconstituição de relações com o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, que já foram muito mais profundas. Com respeito às diferenças e à autonomia de cada espaço, mas entendendo que é possível fortalecer nossa atuação conjunta no PT e nos movimentos. Defendemos a retomada de nossa frente de massas como elemento estruturante de nossa política.

45. Devemos ser nós os porta-vozes no partido da denuncia contra a criminalização dos movimentos sociais, os de levantar cotidianamente a necessidade da reforma agrária, da luta pela redução da jornada de trabalho, do combate ao extermínio da juventude negra, da equiparação salarial e de direitos entre homens e mulheres, da criminalização da homofobia e da necessidade do Partido d@s Trabalhador@s compreender essas pautas como estratégicas.

46. Não é formal, nem diminuto. Não há socialismo sem feminismo, sem combate ao racismo e sem combate à homofobia. Não há socialismo sem que a juventude seja elevada a condição estratégica que ocupa em nossa sociedade e como afirmamos em outrora. Não basta carregar bandeiras, a juventude precisa receber investimento e estabelecer-se protagonista.

47. Não, essas questões, não são menores ou do “campo do privado”. Falamos da igualdade plena entre mulheres e homens, entre brancos e “não brancos”, entre adultos e jovens. Falamos do direito ao próprio corpo, do fim das diferentes hierarquias e exclusões, do reconhecimento da diversidade, da pluralidade, da autonomia. São questões que têm centralidade na construção de um projeto socialista e libertário.

48. No Brasil, a classe trabalhadora foi constituída a partir da força de trabalho de negros e negras. Essa constituição, combinada com o racismo e o patriarcado institucional com a ausência de garantias de direitos e de políticas de reparação, inegavelmente condicionou algumas marcas de opressão registradas em nossa historia que perpetua homens e mulheres negras na base do proletariado, no subemprego e nos postos mais precários de trabalho, nos maiores índices de violência entre as mulheres e de mortalidade entre os jovens. Por isso afirmamos que o enfrentamento ao racismo concatena uma luta com classe e com raça.

49. As experiências das últimas décadas demonstram a insuficiência de uma política de esquerda que não buscou, de fato, resolver a subalternidade das mulheres. A ação do movimento feminista produziu transformações, que têm se desenvolvido, nas últimas décadas, e não se limitaram à consagração de direitos formais. Foi um processo que atingiu e ainda continua abalando as próprias organizações, partidos políticos, sindicatos, movimentos sociais – profundamente machistas.

50. É fundamental compreender que a discriminação contra as mulheres não apenas tem relação com o poder econômico, mas com o sistema de uma dominação masculina que é “universal” e hegemônica. Não se trata de dar primazia ou ao gênero ou a classe social, mas entrelaçar esses eixos de dominação entre si e com outros, esquecidos por formulações socialistas que não incorporam o feminismo, a reflexão antirracista ou a denúncia da heteronormatividade.

51. Claro que ao enfrentar e combater as concepções conservadoras e de direita sobre o papel das mulheres e outros sujeitos históricos subalternos – negros/as, homossexuais, jovens, trabalhadores e trabalhadoras urbanas e rurais do campo e da floresta, as organizações de esquerda e os partidos políticos progressistas foram e têm sido obrigados a incorporar e impulsionar esses debates - que tem influenciado as relações no campo político e da sociedade.

52. No entanto, a intensidade e consistência do compromisso com essa pauta ainda são baixas. Nesse contexto, é possível entender o afastamento orgânico desses sujeitos das estruturas de comando, dos processos de formulação e decisão. O PT e boa parte da esquerda brasileira têm dificuldades profundas para incorporar essa agenda. Isso se evidencia, por exemplo, no debate sobre aborto legal, ações afirmativas, laicidade do Estado, casamento entre pessoas do mesmo sexo, distintos arranjos familiares, legalização das drogas, enfim, uma série de pautas “libertárias”.

53. Para enfrentar esta realidade é necessário trazer para o centro do programa e da nossa ação tais questões, historicamente desprezadas por parte dos que reivindicam o marxismo. A igualdade plena não pode ser um conjunto de referências e discursos ao vento, tem que ser uma práxis política.

54. Não acreditamos que é possível ser socialista sem considerar com centralidade esse conjunto de opressões a serem superadas. Acreditamos que é necessário construir no PT, na esquerda, nos movimentos sociais, a percepção concreta de que a contradição de classe não é a única contradição, nem se estabelece sozinha.

55. É necessário constituir opinião pública sobre essas questões, somar-se a aliados históricos para impulsionar um novo momento político que aprofunde as questões programáticas, que realize agitação e propaganda do socialismo, que retome a iniciativa de disputar no PT nossas opiniões acerca dos grandes temas, não só das pontuais pautas das reuniões do DN. Afirmamos, o PT está em disputa, tal qual o governo o está e é exatamente pó acreditar que é possível retomar nosso protagonismo como esquerda petista que afirmamos uma caminhada de livre debate. Que ao mesmo tempo em que nos ajude a aprofundar nossas formulações, permita a cada vez mais companheiros e companheiras a assumirem tarefas dirigentes, que nos forjem de conjunto numa organização política a altura de responder as demandas de nossa conjuntura.

56. É preciso que essa opinião, que nossas formulações ocupem o campo da disputa institucional dentro e fora do PT. Precisamos estabelecer periodicidade de debates entre a companheirada que ocupa algum tipo de função no governo federal, bem como estabelecer na pauta política da tendência fóruns regulares de debates entre nossas experiências de governos municipais e estaduais.

57. Sobre o tema da reforma política, é necessário assumir uma posição que afirme a participação popular através da quebra da clausula do chamamento de plebiscitos circunscritos ao congresso, da afirmativa de paridade entre homens e mulheres nas propagandas, nos recursos e na oportunidade de voto em lista, bem como a elevação da juventude como no caso de algumas experiências europeias.

61. Enfim, sabemos que essa jornada não é meramente abstrata. Ela deve nos levar a compor um novo campo no partido, comprometido com esse esforço reflexivo, qualitativamente distinto, socialmente diverso, formatado para criar novas formas organizativas e novas relações políticas.

63. Estamos desafiados a ser um polo dinâmico dentro do PT, vocacionada a impulsionar um movimento amplo por mudanças, capaz de atrair militantes combativos, jovens ativistas, feministas, lutadores negras e negros, trabalhadores do campo, engajadas lésbicas, gays e trans, sindicalistas inquietos, intelectuais, petistas rebeldes e outros quadros que já estiveram na mesma trincheira nossa mas se afastaram. Lutadoras do povo!
Abrir um novo período, na esquerda e no PT.

Vida Longa ao Socialismo!

Vida Longa ao PT!

Manifesto "Inaugurar um novo período"

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